segunda-feira, 29 de setembro de 2008

...back to africa... é uma espécie de SPA...

É verdade... voltei a luanda. Durante este tempo que cá estive, várias vezes me interroguei se teria coragem de voltar... desta vez sabia bem para o que vinha, já não tinha ilusões de qualquer espécie... confesso que custou um bocado.
Um mês em portugal deu tempo para matar saudades, resolver algumas chatices recorrentes da minha vida e assistir á criação de problemas novos.
Tudo resolvido dediquei-me ao ócio, ao prazer de acompanhar os meus.
De regresso então ao meu SPA africano encontrei luanda com melhor aspecto, conheci nova gente na casa e encontrei um tuga de Braga, o cunha, com quem fui beber uns copos.
Devo já ter ares de africano... ninguém se meteu comigo á saida do aeroporto.
O tempo que passei em portugal fez-me bem, mas senti constantemente uma nuvem negra no animo dos portugueses... é-se bombardeado por más noticias de manha á noite... não há espirito que possa resistir... fica-se deprimido por contágio...
por isso back to africa... é uma espécie de SPA... aqui respira-se optimismo.
A casa está em obras... remodelação do aspecto geral... lá terei de aguentar... quando chegarem ao meu quarto não sei onde vou dormir...
Chegou á uma semana o Alfredo vindo de Lisboa, virgem em terras ardentes, para a empresa do grupo ligada aos materiais de construção.
Reencontrei o pessoal da casa... senti que o yacine perdeu definitivamente a virgindade africana... pese embora ainda lhe custe muito, devido ás tremendas saudades que tem da mulher e filhos, já se adaptou ao esquema. O yacine é um rapaz para os seus quarenta e tal aninhos que trabalha na empresa ligada ao economato do grupo... gente boa e de muito bom caracter... ficámos a falar tempos sem fim... entristeceu-me saber que poderá vir a ter que mudar para outra casa do grupo... embora seja uma aquisição recente, a sua presença, o seu caracter, o seu espirito verdadeiro faz falta... vou ver se meto uma cunha ao patrão.
Resolvi passar a tarde no Jango Veleiro, uma esplanada á beira mar na ilha de luanda, disfrutar a praia, o sol e conversar com a nova aquisição... o Alfredo.
"não vou aguentar... não sei, mas isto..." disse ele pensativo. "não penses nisso pá... vais ver que depois de conheceres o mussulo, as praias, as paisagens fora de luanda... vais mudar de opinião... aguenta o primeiro mês e depois decides..." disse eu.
A musica estava boa, ao vivo... uns brasileiros a tocar. Ao chegar á casa de banho confrontei-me com um preto gordinho vestido de branco que se ria tanto tanto que dei por mim a rir-me com ele... o riso dele provocou-me um ataque de riso incontrolavel... o homem não parava " roberto carlos... o hombre está cantando roberto carlos..." ria-se descontroladamente a referir-se aos musicos que tocavam na esplanada. Percebi, no meio das gargalhadas, que o tipo hablaba espanhol e perguntei-lhe de onde era. "soy de cuba... e estoy cá á seis años... " disse. Estabelecemos logo ali uma conversa de pessoas que parecia que já se conheciam á decadas... deu-me um abraço quando lhe disse que conhecia havana e que gostava muito da musica cubana.
Iniciamos uma conversa sobre o estado da nação... politica, economia... enfim essas coisas... "sr. ricardo... fala 'fulano' da alfandega... lembra di mim... sou áqueli do fcpórto... já chigô?... intão trouxi á camisola..." telefonou um rapaz que conheci nos serviços de fiscalização da alfandega.
"ópá... ahh... pois cheguei... e não me esqueci de vocês... trouxe um chapeu do fcp... já não havia camisolas... e trouxe um do slb também para o outro teu amigo..." respondi eu.
Confesso que fiquei admirado que o tipo um mês depois da minha saida se tenha lembrado da 'promessa' que lhes fiz. É que, há um mês, quando passei os serviços de alfandega de regresso a portugal, os tipos revistaram-me tudo peça por peça, livro a livro, folha a folha... trazia dois portáteis... "dois portáteis !?..." disse um deles. "claro amigo... um tem web cam e o outro não" respondi-lhe. Parece que não percebeu, mas a resposta satisfez.
Os tipos queriam 'conversa' e eu precisava rápidamente de cortar o rumo da coisa... "haa e depois o computador maior serve para ver o futebol do campeonato português... " eu disse. Bonzai puxei o assunto certo o tipo era adepto do grande fcp... mas logo se juntou o amigo.
"dá prá você trazer uma camisola do pórto ?" disse o primeiro. "haa e uma do benfica" disse o amigo.
Prometi-lhes então trazer uma de cada clube, pediram-me o numero de telefone e pronto andaram sempre a espera do meu regresso. Felizmente eu não me esqueci, e comprei-lhes algo mais barato... os chapeus, muito embora não tenha gostado muito de ter comprado o vermelho. Um dia destes vamos combinar um encontro para lhos entregar.
É sempre útil fazermos certos 'amigos' em certas posições.
O Alfredo tinha ouvido umas histórias ácerca de angolanas... "épá disseram-me para nunca confiar numa rapariga angolana com unhas grandes e pintadas..." afirmou estranhamente. "elas colocam um pó debaixo das unhas, bem escondido... e na primeira oportunidade... colocam o pó na bebida... depois 'limpam-te'..." continuou.
Confesso que já era a segunda vez que me diziam tal coisa... a primeira foi o motorista que disse para ter muuuuito cuidado com o que bebo na empresa... café... água. "num toma nada lá na empresa doutô... podem deitar coisa ná bébida... ".
Na altura tomei a decisão de não guardar a garrafa de agua de um dia para o outro, peço sempre uma devidamente fechada... e café vou á rua tomar.
Não me parece que a coisa seja assim como dizem... mas enfim o seguro morreu de velho mas o desconfiado ainda vive.





quinta-feira, 4 de setembro de 2008

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Penteado olé... penteado olé...

Bom... já faltava... na minha modesta arrogancia, cantava aos quatro ventos, que ainda não havia sido 'penteado'... começava a a sentir-me mal... de tanta sorte vivida. Era, digamos, um oásis de secura, nesta selva urbana.
Não havia forma da policia mandar-me parar... os tipos não queriam nada comigo... andava, de certa forma curioso... que penteado me fariam? com corte e lavagem? rapado? risca ao meio?
Neste dia foi um penteado simples... vi o sr. agente a estender o braço... parei logo a seguir. Depois da continência, pediu-me os documentos... entreguei-lhos todos, num molho. Estava tudo certo... sentia-se na cara dele um certo desalento... cheguei a ter pena dele... pegou-me na carta de condução e manteve-a apertada na mão... olhou para o interior do jipe... "hã, falta ali á placa com u nomi i á moráda... bô tê que passar multa...", respirou ele de alivio. "Ah é? ok passe lá a multa... o proprietario do veiculo é a empresa x... tudo bem amigo passe lá a multa..." eu disse relaxadamente.
Senti de novo o desalento na face do sr. agente... mas o tipo era dos bons... "não, eu vou tê qui multá á carta di condução e não o carro..." retrucou o finório... "mais podemo risolvê a coisa áqui mésmo" continuou.
Na realidade só tinha us dolares comigo e as notas mais altas... aquilo não merecia um gasto tão avultado..."ivan tens aí qualquer coisinha...?" eu perguntei.
A festa ficou-se just for a thousand kuanzas, o equivalente a uns oito euros. Depois da troca de galhardetes desejamo-nos mutuamente um excelente dia. Na verdade tratou-se de um roubo simpatico entre pessoas de bem, que se entenderam na perfeição. Nada a dizer. A virtude nos negócios prima também pela simpatia... um ladrão simpatico é outra loiça. Talvez a mulher dele tivesse telefonado uns minutos antes a pedir-lhe para passar no supermercado e trazer as compras em falta... e nessas alturas nada melhor do que apanhar um nabo fresquinho de portugal.
Em todo caso cantei "haa penteado olé... penteado olé...". Não há nada como viver as coisas para saber como proceder no futuro em situação análoga... foi mais fácil do que imaginava... mas o sr. agente também ajudou muito para esta minha aprendizagem, devo admitir.
No dia seguinte foi-nos buscar o reis, regressado de portugal, o destino era passar Viana rumo a Catete.
Antes porém o reis, talvez já farto do penteado que usava, decidiu atalhar por uma estrada em sentido proibido... lá bem no fundo da estrada, operação stop... havia barbeiros, cabeleireiros e tosquiadores... um deles mandou-nos parar... o reis saiu-se bem... dois minutos depois lá estava ele com um ar 'limpinho', asseado e muito bem penteado... ao preço de tabela.
Tinhamos de passar em Viana e buscar o luis, um tuga que trabalha para uma empresa de construção; é como que o master chief dos trolhas; é o responsável por toda a coordenação de trabalhadores nos empreendimentos que estão em curso, tipo capataz. Era sócio do reis em portugal numa empresa de construção e reconstrução de edificios... mas já não tinham muito trabalho em portugal, e as margens eram insuficientes... já para não falar dos 'calotes'...
Anyway, rumamos então a catete; já perto o reis chamou-me a atenção para uns edificios militares... "aqui era o quartel central de toda a actividade portuguesa... todo e qualquer militar vindo de portugal para combater em angola passava necessáriamente por alí... e depois era distribuido pelas provincias..."
Aquelas instalações eram baixas de um piso só e estendidas no terreno, com avenidas largas... pareciam instalações bem estruturadas...
Mas á medida que o reis falava, eu tirava fotografias... achei que o meu pai tinha estado ali... no tempo da guerra... e teria estado lá cerca de dois anos... o curioso é que quarenta anos depois passei pelo mesmo local, a cinco mil quilometros de portugal... tive uma sensação agradávelmente esquisita.
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Mais tarde chegou a confirmação a minha mãe lembra-se e afirmou que ele tinha estado de facto nas instalações militares de catete. Boa!
Passando catete, convenci o pessoal a visitar uma fazenda de bananas... prontamente iniciamos o caminho... o reis conhecia uma fazenda ali perto. Mas primeiro paramos para almoçar na zona do 'bom jesus' num restaurante no sopé do rio kuanza... local esplendoroso... mulheres a lavar a roupa no rio... crianças a brincar na água... rapazes a pescar. O almoço foi um peixe do rio com molho vinagrette com feijão e pedaços de mandioca... muito bom... mesmo.

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Fiquei fascinado com a paisagem... a natureza no seu verdadeiro estado... a vegetação potente...
Pensei, por diversas vezes, o quão diferente são estas paisagens... aprecio as coisas no seu estado natural.
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Se visualizarmos a nossa paisagem, em portugal, verificamos que a mesma foi transformada pelo homem, em todo lado. As praias estão condicionadas por muros de betão, as margens dos rios guiadas... o homem não deixa a natureza seguir o seu rumo, é assim a evolução... mas é bonito observar a natureza a tomar as redeas das coisas... para variar.
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Enquanto observava a fazenda e todo o enquadramento da mesma, sonhava, sonhava e voltava a sonhar... imaginava-me a cavalo ou de moto4 a percorrer a 'minha' própria fazenda... por aquelas infindáveis avenidas de bananeiras... olhava para o lado esquerdo e seguia-me o rio kuanza, quase ao mesmo nível... lindo...
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No regresso tivemos a excelente ideia de parar num café/restaurante em viana... estavamos com fome... verifiquei que estava repleto de portugueses... das obras!!! sentou-se ao nosso lado, na nossa mesa, um tuga... se tivesse sido protagonista do filme italiano 'feios, porcos e maus' teria sido concerteza laureado com um oscar para a melhor caracterização.
O tipo, além de bem bebido... era... indiscritivel... falava pelos cotovelos... chamava constantemente pelas empregadas... e fazia-lhes, a todas, declarações com um tal conteúdo... que me reservo no direito de as não publicar integralmente... para não ofender as almas mais susceptiveis.
Senti-me péssimamente... envergonhado... o ivan, o reis e o luis também... o homem contava histórias de pasmar... acerca de tugas das obras que lá viviam... longe de casa, alguns viviam com as 'dama' lá nos musseques.
"aqueles caral... agora vivem numa barraca com as pretas, sem electricidade, nem agua, nem esgotos... nada... mas é isso que as gajas querem... um fil... da p... estupido que lhes pague as despesas, o telemovel, a comida... os gajos de dia boum trabalhar e elas metem lá outros... dass a mim num mapanham essas pretas do caral... tinha uma em portugal... mandava-lhe a massa todos meses e ela metia lá outros... ta q pari... agora aqui, tenho as que quizer" gabou-se o grande tuga português. "oh paula... paula minha linda chega aqui... olha tu és muito bonita... dás-me o teu numero de telefone minha linda" continuou o irrascível tuga a olhar fixamente o decote da rapariga.
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Confesso que não lhe adivinhava grande futuro... mas enfim passado cinco minutos lá apareceu uma a dar-lhe o numero de telefone. "esta já está... hoje temos festa..." concluiu.
Resolvemos finalmente sair... antes porém o homem veio-me cumprimentar... "doutor desculpe lá... ás vezes não me contenho" disse ele regressando finalmente a um normal ser humano. "não faz mal amigo... mas pense que estas raparigas podem estar a passar o mesmo que as suas próprias filhas em portugal... por isso não as trate assim" eu disse para aliviar. "desculpe doutor... " ele finalizou.
Na verdade a distancia de portugal, a par das más condições em que esta gente trabalha... transforma-os e traz ao de cima o pior que o ser humano tem... na realidade as desculpas daquele homem revelam que o mesmo não éra na realidade assim...