É verdade... voltei a luanda. Durante este tempo que cá estive, várias vezes me interroguei se teria coragem de voltar... desta vez sabia bem para o que vinha, já não tinha ilusões de qualquer espécie... confesso que custou um bocado.
Um mês em portugal deu tempo para matar saudades, resolver algumas chatices recorrentes da minha vida e assistir á criação de problemas novos.
Tudo resolvido dediquei-me ao ócio, ao prazer de acompanhar os meus.
De regresso então ao meu SPA africano encontrei luanda com melhor aspecto, conheci nova gente na casa e encontrei um tuga de Braga, o cunha, com quem fui beber uns copos.
Devo já ter ares de africano... ninguém se meteu comigo á saida do aeroporto.
O tempo que passei em portugal fez-me bem, mas senti constantemente uma nuvem negra no animo dos portugueses... é-se bombardeado por más noticias de manha á noite... não há espirito que possa resistir... fica-se deprimido por contágio...
por isso back to africa... é uma espécie de SPA... aqui respira-se optimismo.
A casa está em obras... remodelação do aspecto geral... lá terei de aguentar... quando chegarem ao meu quarto não sei onde vou dormir...
Chegou á uma semana o Alfredo vindo de Lisboa, virgem em terras ardentes, para a empresa do grupo ligada aos materiais de construção.
Reencontrei o pessoal da casa... senti que o yacine perdeu definitivamente a virgindade africana... pese embora ainda lhe custe muito, devido ás tremendas saudades que tem da mulher e filhos, já se adaptou ao esquema. O yacine é um rapaz para os seus quarenta e tal aninhos que trabalha na empresa ligada ao economato do grupo... gente boa e de muito bom caracter... ficámos a falar tempos sem fim... entristeceu-me saber que poderá vir a ter que mudar para outra casa do grupo... embora seja uma aquisição recente, a sua presença, o seu caracter, o seu espirito verdadeiro faz falta... vou ver se meto uma cunha ao patrão.
Resolvi passar a tarde no Jango Veleiro, uma esplanada á beira mar na ilha de luanda, disfrutar a praia, o sol e conversar com a nova aquisição... o Alfredo.
"não vou aguentar... não sei, mas isto..." disse ele pensativo. "não penses nisso pá... vais ver que depois de conheceres o mussulo, as praias, as paisagens fora de luanda... vais mudar de opinião... aguenta o primeiro mês e depois decides..." disse eu.
A musica estava boa, ao vivo... uns brasileiros a tocar. Ao chegar á casa de banho confrontei-me com um preto gordinho vestido de branco que se ria tanto tanto que dei por mim a rir-me com ele... o riso dele provocou-me um ataque de riso incontrolavel... o homem não parava " roberto carlos... o hombre está cantando roberto carlos..." ria-se descontroladamente a referir-se aos musicos que tocavam na esplanada. Percebi, no meio das gargalhadas, que o tipo hablaba espanhol e perguntei-lhe de onde era. "soy de cuba... e estoy cá á seis años... " disse. Estabelecemos logo ali uma conversa de pessoas que parecia que já se conheciam á decadas... deu-me um abraço quando lhe disse que conhecia havana e que gostava muito da musica cubana.
Iniciamos uma conversa sobre o estado da nação... politica, economia... enfim essas coisas... "sr. ricardo... fala 'fulano' da alfandega... lembra di mim... sou áqueli do fcpórto... já chigô?... intão trouxi á camisola..." telefonou um rapaz que conheci nos serviços de fiscalização da alfandega.
"ópá... ahh... pois cheguei... e não me esqueci de vocês... trouxe um chapeu do fcp... já não havia camisolas... e trouxe um do slb também para o outro teu amigo..." respondi eu.
Confesso que fiquei admirado que o tipo um mês depois da minha saida se tenha lembrado da 'promessa' que lhes fiz. É que, há um mês, quando passei os serviços de alfandega de regresso a portugal, os tipos revistaram-me tudo peça por peça, livro a livro, folha a folha... trazia dois portáteis... "dois portáteis !?..." disse um deles. "claro amigo... um tem web cam e o outro não" respondi-lhe. Parece que não percebeu, mas a resposta satisfez.
Os tipos queriam 'conversa' e eu precisava rápidamente de cortar o rumo da coisa... "haa e depois o computador maior serve para ver o futebol do campeonato português... " eu disse. Bonzai puxei o assunto certo o tipo era adepto do grande fcp... mas logo se juntou o amigo.
"dá prá você trazer uma camisola do pórto ?" disse o primeiro. "haa e uma do benfica" disse o amigo.
Prometi-lhes então trazer uma de cada clube, pediram-me o numero de telefone e pronto andaram sempre a espera do meu regresso. Felizmente eu não me esqueci, e comprei-lhes algo mais barato... os chapeus, muito embora não tenha gostado muito de ter comprado o vermelho. Um dia destes vamos combinar um encontro para lhos entregar.
É sempre útil fazermos certos 'amigos' em certas posições.
O Alfredo tinha ouvido umas histórias ácerca de angolanas... "épá disseram-me para nunca confiar numa rapariga angolana com unhas grandes e pintadas..." afirmou estranhamente. "elas colocam um pó debaixo das unhas, bem escondido... e na primeira oportunidade... colocam o pó na bebida... depois 'limpam-te'..." continuou.
Confesso que já era a segunda vez que me diziam tal coisa... a primeira foi o motorista que disse para ter muuuuito cuidado com o que bebo na empresa... café... água. "num toma nada lá na empresa doutô... podem deitar coisa ná bébida... ".
Na altura tomei a decisão de não guardar a garrafa de agua de um dia para o outro, peço sempre uma devidamente fechada... e café vou á rua tomar.
Não me parece que a coisa seja assim como dizem... mas enfim o seguro morreu de velho mas o desconfiado ainda vive.