domingo, 27 de julho de 2008

baixa-te, dá-lhe …manda-lhe um murro nos…

… e assim se passaram vinte e dois dias em Luanda; uns bons outros maus, outros bem pelo contrário.
Algo se apoderou de mim, já não consigo raciocinar normalmente; dou comigo a dizer e pensar coisas inimagináveis á vinte e dois dias atrás.
O meu cérebro dividiu-se definitivamente, agora uma metade é africana, a outra é europeia.
A luta dos meus neurónios, será não deixar que cada metade avance muito e monopolize a casa.
Convém, pois, estar atento a esta guerra fraticida, não é tarefa fácil; A metade do meu cérebro europeu vê tudo ao pormenor, não facilita; é a internet lenta, é a sujidade, é a miséria …; a outra metade até já considera um luxo a casa onde mora, o pequeno esgoto do passeio a céu aberto, umas horitas de trânsito para o trabalho…
Quando viajar a Portugal a metade europeia deverá despertar, acredito eu, mas sei lá…imagino-me ás vezes na av. da liberdade, lá em braga, em hora de ponta a descer a toda velocidade pelos passeios, a passar os vermelhos todos, a não dar prioridade a ninguém, a apertar as ambulâncias, a atirar latas pela janela…enfim.
Sexta feira á noite; ilha de Luanda. Voltei a jantar no restaurante do portugûes. Desta vez foi para despedida da família reis, que vai de férias a Portugal.
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A mulher está feliz da vida…não cabe de tão contente…só foi pena não ter conseguido embarcar nessa noite; coisas deste país… até a minha metade africana bocejou; não é que com bilhete comprado, confirmação carimbada, a companhia aérea taag deixou em terra cem pessoas!
Não, não eles não chegaram atrasados…passageiros de última hora e com direitos superiores aos comuns mortais conseguiram a proeza de viajar por substituição dos meus companheiros. Dizem as más línguas que …” foi necessário trazer pessoas importantes ao funeral de alguém igualmente importante … vocês sabem do que estou a falar …” e por ordens expressas de alguém não menos importante, substitui-se os passageiros á entrada para o check in. Sim senhor.
“baixa-te, dá-lhe …manda-lhe um murro nos…, vai buscar a cadeira e acerta-lhe …” pensava a minha metade africana enquanto assistia á revolta e agressão de um dos passageiros preteridos. ”O gajo tem razão, mas também não era necessário aquela violência ao funcionário da taag…” despertava a minha metade europeia.
Talvez por estas e por outras o espaço aéreo europeu é interdito a voos daquela companhia aérea angolana.
Bom, como está bom de ver, fui buscar ao aeroporto a família reis e levei-os até ao “chill-out” para descontrair o reis, a mulher e o filho, que pareciam abatidos.
Este bar é sofisticado, junto ao mar, com praia, aberto, musica a bombar, bom ambiente, muitos tugas, mas a entrada é de rir e chorar por mais…
Centenas de pessoas a querer entrar barradas pelos porteiros; tipos importantes, cheios de peito, que escolhem indiscriminadamente as pessoas para entrar; senti-me uma criança no tempo do ciclo que queria entrar nas discotecas e não tinha idade; valia sempre a boa vontade e humor do sr. porteiro.
Aliás o porteiro aqui, é de facto uma pessoa importante, penso até que configura um perfil capaz de substituir á última hora passageiros no aeroporto; está nesse lote de pessoas de peso.
Como ninguém entrava, excepto aqueles a quem o sr. porteiro apontava o seu dedo com poder magistral, resolvemos falar com sua reverência, o porteiro, e convencê-lo das nossas virtudes; sua santidade, o porteiro, foi então sensível aos nossos argumentos; por magia, quais predestinados da vida, desfilámos pelo acesso á entrada como heróis; invejados por uns, amaldiçoados por outros, mas lá nos foi concedido tal desiderato.
Anyway, a última vez que jantei no tal restaurante português foi com uma companhia de peso, lá do Minho, Vizela. Confesso que já tinha saudades de ouvir falar alguém daquela zona.
Partilhar o mesmo sotaque é mais relaxante, sentimo-nos em casa; e depois o Raul e a mulher, sendo amigos desde os tempos da cowboiada, da minha xinha e do meu cunhado zé nog, quando ainda namoravam, passa a ser meu amigo também.
Com efeito, encontrei um tuga divertido e simpático, com sentido de humor e que até já leu os meus posts.
“daqui a um ano…vais-me dizer se ainda pensas assim…” disse-me ele.
“porquê? sou muito comedido …” ri-me.
“não não, é que se as coisas não fossem assim, como são, (leia-se ‘más’), não podíamos ganhar... o que ganhamos…estar aqui...” retrucou o Raul.
“bem pensado…” a minha metade esquecida observou.
“eu, não quero que mude nada…absolutamente nada” afirmou o Raul convicto. Fez-se-me luz, confesso.
O Raul é prático, o que pensa diz, mas quando fala comigo vejo nos olhos dele, de certa forma, um reviver das coisas que também passou quando cá chegou. Ainda tem muito para contar…
Já cá anda há cerca de seis anos, é proprietário de umas lojas e armazéns na zona de s.paulo; tem agora cinquenta e tal aninhos, mas não os aparenta, nem física nem mentalmente.
Lembra-se de mim vagamente talvez com os meus sete, oito anos ainda em Felgueiras; lembra-se bem do meu dad and mom e das conversa que mantinha com ele. "gostava muito de falar com ele..." lembrou o raul.
Na verdade prometi-lhe, embora muito muito muito vagamente, que aquela parte da conversa era off-record, que naquele momento não trabalhava no “crónicas da terra ardente”, mas enfim o ‘crónicas…’ não é pressionável, é rigoroso e independente, atento á verdade das coisas, e depois, já se passaram mais de vinte anos sobre os factos ocorridos.
“ó pá, sabes estou convencido que a… até terá sido… digamos…  elaborada... num acampamento que a malta fez lá no norte, num parque campismo… é que o teu pai… não facilitava a coisa quanto a liberdades… e as raras oportunidades naquela idade… sabes como é...” confidênciou o Raul.
“pois então não sei…pá… eu na altura, era dama de companhia, presença obrigatória, imposta, do tipo fiscal; o meu pai lá sabia das coisas... mas desconhecia o meu já precoce espírito angolano, pois ia recebendo ‘gasosa’ para os… deixar… falar sozinhos á vontade; ou era uma bola, ou outra coisa qualquer que me fizesse... digamos... andar distraido...ocupado” concluí.
Mas ainda bem que as coisas são e foram assim mesmo, caso contrário não tinha o enorme prazer de ser, como sou, pasme-se...tio-avô.
A conversa estava boa, os temas variados, mas o que me fez rir, a propósito da capacidade que o povo angolano tem para sobreviver, foi quando o Raul me disse…
“ó pá no verão quando chove … isto não se pode andar … as estradas ficam alagadas… só mesmo de jipe; o problema é que quando estacionas como é que sais sem te molhar até aos joelhos?” continuou “os gajos tem duas soluções…em cada uma tens que desembolsar uns kuanzas… na primeira os gajos põe umas pedras grandes, ou baldes no meio da estrada… tu paras o carro e vais pisando os mesmos até chegares ao passeio…com equilíbrio.”
“então e a segunda?”, eu perguntei interessado.
“bem a segunda é um gajo levar-te ás cavalitas até ao passeio” riu-se ele.
Gostei, confesso que gostei.
Fiquei a imaginar a cena… ás cavalitas do angolano.
Fantástico.

3 comentários:

BibaRita disse...

Tio este domingo corremos e não paramos de rir com o teu Mariozinho! bem, ele é o verdadeiro terrorista no bom sentido!! não para! imagina q até a Matita (a tua sobrinha-neta) dizia: "ele não pára, o Mariozinho nunca pára"! entre mergulhos salgados e doces foi uma tarde mt divertida com a Primalhada! claro q o motivo principal da conversa foram os post daki do teu cantinhu (blog)! cada um falava dakele q mais gostou e dai se desencadeava uma outra conversa sobre um ou outro assunto actual: Socrates, Angola, Bancos etc etc...
Os teus 3 tao LINDOS como sempre!! e imagina até comentei q o Marocas tem mts gestos e expressões do tuas!
"CáCá".. continuação de boa "aventura"!
;)

email disse...

ttt

Anónimo disse...

Sim senhora!Nem a própria lá chegou!Eu até parece que ouvi a histótia toda...então contadinha por quem sabe contar....e até acho que foi mesmo assim!!Hoje não serias tio avô com trinta (e tal anitos!).Qto a porteiros, estamos entendidos:UAGH!tirem-me Um da frente!!!!
A ideia do teu lado africano a descer a av.da liberdade, em braga...Tá Demais!Tenho uma Amiga Africana que está urgentemente a precisar de ir aí!Mas os neurónios dela são de alto kilate!Está é a deixar dormir demais os angolanos!
Boa mano!O teu Mário tá demais!Cá pra mim deste-lhe duracell e agora a mãe anda a preparar-se para os olímpicos!Beijo!